A teoria dos jogos, como é aplicada no poker, é complicada e confusa. É fácil se sentir desorientado ao ler livros com enfoque matemáticos, como The Mathematics of Poker. Por isso, é importante notar que você não precisa ser um mestre da teoria nem precisa memorizar cada detalhe de soluções de situações específicas para utilizar a teoria dos jogos a seu favor. O ponto de estudá-la não é memorizar as especificidades, mas aprender a entender os princípios gerais, como, por exemplo, os blefes.
Uma das lições mais importantes que aprendi da teoria dos jogos é que mãos pega-blefe são superestimadas. Isto não significa que essas mãos não devem ter lugar no seu jogo, apenas que elas raramente devem ser seu Plano A.
Em uma situação ideal de equilíbrio, jogadas pega-blefe tendem a ser breakeven. Isto é, a menos que você consiga realmente bater alguma porção do range de valor do seu oponente (nesse caso o termo pega-blefe talvez não seja mais plausível de se usar), ou você tenha alguma carta blocker para este range, a única maneira de fazer dinheiro com mãos pega-blefe é se seu oponente, obviamente, blefar. E não ocasionalmente, ele precisa blefar bastante para tornar a jogada lucrativa. Com as mãos corretas é seguro tentar, mas não é uma situação especialmente rentável ou desejável de se estar muito frequentemente.
Ao enfrentar uma aposta, o valor de suas mãos pega-blefe puras, isto é, as que batem todos os blefes mas que perdem para todas mãos com valor, é inteiramente dependente da frequência com que seu oponente blefa. Contra um vilão que tem uma frequência otimizada de blefes, o valor em pagar com essas mãos é $0, o mesmo que seria se você optasse pelo fold.
Se tanto pagar quanto dar fold têm um EV de $0, você pode se perguntar, por que pagar?
Por que tentar pegar blefes?
Lembre-se que um oponente blefando, teoricamente, de forma otimizada em um jogo é, bem, uma teoria. É uma suposição que fazemos na falta de estimativas melhores de sua estratégia. Se caso o vilão tiver uma estratégia particularmente ruim, onde ele acaba blefando com mãos que são muito fortes para transformar em blefes, então, seus pega-blefes que antes eram breakeven agora se tornam jogadas lucrativas. Então, pagar com essas mãos é uma ótima oportunidade de fazer dinheiro, contanto que você não comece a pagar com tantas mãos que incentive seu oponente a parar de blefar totalmente.
É verdade que se você acredita que seu oponente blefará muito frequentemente em uma dada situação, jogar mãos pega-blefe se torna lucrativo. No entanto, muitas pessoas tendem a julgar de forma errônea essas situações, o que os leva a enfatizar demais esse tipo de jogada em sua estratégia.
Por exemplo, “uma boa oportunidade para pegar blefes” não é necessariamente quando seu oponente parece estar inclinado a blefar. Escuto muitos calls justificados com falas como “Pensei que ele estava apenas blefando a scary card” ou “Era um bom spot para ele blefar.”
Geralmente, a razão que faz cartas scary serem assustadoras é que elas são legitimamente boas para o range do oponente. Uma vez que é verdade que elas induzem o oponente ao blefe, o que é deixado de fora dessa análise é que elas também abrem muitas oportunidades de apostas por valor, já que o que importa não é simplesmente quantos blefes seu oponente faz, mas sim a razão de blefes para apostas por valor. Assim, as chamadas “scary cards” não são, por si só, uma razão melhor ou pior do que qualquer outra carta para influenciar sua decisão de tentar pegar um blefe ou não.
O inverso também é um erro comum. Muitos jogadores irão, equivocadamente, concluir que um oponente que aposta em uma carta inócua no turn não está blefando apenas porque aquela carta “não muda nada no board”. Já que não é uma “scary card”, parece que o oponente nunca blefará e, portanto, deve ter uma mão com valor.
Por muitas das mesmas razões o argumento não se segura. Pode ser o caso que seu oponente blefará menos frequentemente em uma carta específica ou outra, mas não existe uma razão, à princípio, que possa nos fazer assumir que ele ou ela não blefará nunca com determinada carta, tudo depende da situação.
Mesmo em casos onde você tem ou um blocker ou uma leitura que lhe permite jogar mãos pega-blefe de forma rentável, esses calls ainda tendem a ser apenas marginalmente +EV. Em outras palavras, você geralmente estaria melhor se simplesmente desistisse da mão.
Quando você leva mãos pega-blefe para o showdown, seu EV é igual à chance que você tenha a melhor mão, o que geralmente é um valor bem maior que $0. Quando seu oponente aposta, a chance que você tenha a melhor mão geralmente diminui, e, além disso, você deve colocar dinheiro extra no pote para ver o showdown, o que significa que seu Valor Esperado (EV) diminuiu. Transformar sua mão em um pega-blefe é algo que seu oponente leva você a fazer, e não algo que você deve tentar fazer consigo mesmo.
O maior erro ao transformar uma mão em “pega-blefe”
O maior erro que tenho em mente quando digo “transformar sua mão em um pega-blefe” é aquele caso onde o jogador pega uma mão que é forte o suficiente para apostar por valor e, ao invés disso, escolher dar check alegando que quer dar ao adversário “uma chance para apostar”. O que nós acabamos de ver, no entanto, é que sua mão geralmente não ganha valor quando enfrenta uma aposta. Se ela ganhar, será o resultado de um erro por parte do seu oponente, o que não é algo com o qual podemos contar sempre.
A maioria dos oponentes, ao se manter dentro do usual perfil loose-passivo de “fish”, está mais inclinada a cometer erros loose (pagar) do que agressivos (apostar). Ao dar check com mãos fortes, você não apenas dá ao seu oponente a chance de apostar, mas também a de dar check.
Frequentemente, tanto a aposta quanto o check custam dinheiro para você. Quando seu oponente aposta, sua mão perde valor pois é reduzida a um pega-blefe, mesmo que seja um daqueles ligeiramente rentáveis. Quando ele ou ela dá check, a mão perde valor pois seu range de check normalmente consiste de mãos mais fracas que as suas, incluindo algumas que podem ter chance zero de melhorar até o river. Você perde valor tanto ao deixar essas mãos verem uma carta grátis quanto ao deixar mãos fracas, que provavelmente não pagariam uma aposta, chegar mais perto do showdown. Em outras palavras, você perdeu a oportunidade de extrair valor de seu oponente ao transformar muitas de suas mãos em pega-blefes.
Esse erro é particularmente perigoso quando feito com mãos muito fortes, já que jogar de “pega-blefe” com essas mãos também lhe dá o maior EV possível. Isto acontece porque elas estão à frente, e muito à frente, mesmo de mãos do range de valor do vilão. Não é surpresa que mãos premium têm o maior valor se comparado a outras pega-blefes: mãos nuts ou quase nuts tem alto EV, não importa como você jogue elas (contanto que não dê fold). A questão não é se elas são pega-blefes rentáveis ou não, mas se jogar desta forma com elas é a estratégia mais rentável ou não.
A resposta é que raramente é a melhor estratégia. Sim, se você der check numa mão forte, seu oponente pode, erroneamente, assumir que tem a melhor mão e apostar por valor mãos muito piores que a sua. É importante perceber, no entanto, que essas mãos também teriam pago uma aposta caso você tivesse feito uma.
Pense sobre dois conjuntos de mãos: aquelas que apostarão mas não pagarão uma aposta (blefes) e aquelas que pagarão mas não apostarão (pega-blefes). Se você tentar extrair valor da primeira, você estará à merce da frequência de blefe do seu oponente. Mesmo se ele ou ela realmente blefa frequentemente, é necessário que o blefe ocorra tão frequentemente que seja suficiente para compensar por todo o valor que você está perdendo quando ela der check em uma mão que teria pago uma aposta sua.
Apostar com mãos fortes deixa você dependendo menos do acaso. A única coisa com a qual você precisa se preocupar aqui é que seu oponente dê folds excessivamente conservadores. Esse é um erro bem menos comum, já que, novamente, a maioria dos jogadores está na categoria dos loose-passivos. Além disso, o tipo de jogador que dará fold muito frequentemente não é, geralmente, o tipo que você deve explorar com essa jogada de qualquer forma.
Às vezes, pagar com um pega-blefe puro será rentável, porém, você não deve procurar por essas situações, deixe elas chegarem até você. Procure por oportunidades rentáveis e elas aparecerão naturalmente.
Suponha que você aumentou com :As :5s de posições iniciais e foi pago pelo botão. O flop vem :Ad :8c :2h .Eu sugiro que você dê check no flop, já que é improvável que você seja pago por mãos piores que a sua. Você não está exatamente esperando por uma aposta, o que poderia representar um blefe ou uma mão que pode bater a sua.
O que você realmente deve esperar é um check, para que possa extrair valor em streets futuras. Depois de darem check no flop, muitas das mãos mais fortes se tornam menos possíveis para ambos. Isso significa que se ele ou ela também deu check no flop, sua mão se tornará mais forte no turn. Isso é verdade não importa qual carta venha no turn.
No processo de tentar criar essa situação você pode acabar com mãos pega-blefe, mas esta não deve ser sua principal meta.
Artigo traduzido e adaptado do original: To Catch a Bluff